quarta-feira, 29 de outubro de 2025

Capítulo 54: Dia das mães.


    Alguns Beautifly voavam como se dançassem sobre as flores do canteiro no quintal de uma casa grande, mas de aspecto simples, cercada por tábuas brancas e com a caixa de correios já descascada pelo tempo. Brendan estava sentado na janela que dava para os fundos, com os joelhos dobrados e o celular apoiado neles, sorrindo como um bobo para as mensagens que não paravam de chegar. Estava sem a touca, e seus cabelos balançavam ao vento livre da sua cidade natal, sem prédios, sem carros barulhentos e sem os muitos Pidgey.


    Não fazia tanto tempo desde sua última visita. Brendan notou poucas mudanças em Littleroot: algumas flores novas que Salamence regava no quintal, o letreiro do laboratório de Birch trocado por um de neon extravagante, que o professor certamente adorava, e a pequena igreja da cidade agora com uma rampa de acesso. Sobre ela, um Swalot rastejava devagar, com a bíblia flutuando dentro de seu corpo gosmento.

Queria estar com você hoje...
Eu também... Estou com saudades.
Poderíamos estar jogando Azoth Kombat!
Pra você levar outra surra minha??
Você está muito convencido para quem só venceu uma vez!
Hehe, quando eu voltar, vamos ver quem leva a melhor.
Mas como está o seu dia das mães?
Temos uma programação que Marley e eu criamos quando éramos crianças, e todos os anos seguimos ela com os meus pais. Envolve ver filmes e fazer um bolo juntos, você iria gostar.
Parece divertido mesmo! Seu pai vem?
É a pergunta que não quer calar... Ele disse que sim.
A Marley está me chamando, eu já volto!
 💛

    Brendan sentiu suas bochechas esquentarem quando recebeu a última mensagem, um coração amarelo. Ele bloqueou a tela do celular, levando-o ao peito e olhando para o céu do lado de fora, que reagiu cintilando. Da última vez que esteve ali, era com Brock que trocava mensagens, e sabemos como as coisas terminaram... Sem que percebesse, o brilho que ultrapassava as nuvens cessou.


  Você não desgruda mais disso?  A voz de May o acordou de seus pensamentos, e ele riu para ela.  Não vai morrer por passar um feriado longe daquele garoto.


  Ei, calma! Só estávamos conversando!


  Amigo, você passou a viagem inteira trocando mensagens com ele. Até a Lisia perguntou se tinha acontecido algo... E aconteceu? Vocês dois...?


  Ah...  Brendan pensou um pouco, percebendo May bem atenta ao que ele diria.  Não, claro que não. Somos só amigos e estamos... discutindo sobre um trabalho da escola.

  Sei.  Ela levantou uma sobrancelha, sabendo que estava mentindo, afinal o flagrou de mãos dadas com Barry no parque de Jubilife. — Eu mostrei o meu quarto para a Lita e para a Eevee, elas ficaram impressionadas com a quantidade de pôsteres que eu tinha da Elesa.

  Ee!  Eevee veio andando meio torto enquanto Lita flutuava como um balão.

  Ela é uma gracinha!
 — Brendan desceu da janela para acariciar a cabeça da pequena, que espirrou em sua mão, deixando-a toda melecada  Que isso, é sinusithcy?


  Ai, não sei, ainda nem deu tempo de levar no Centro Pokemon! Mas ela costuma espirrar bastante e é bem gelada. Não decidi o seu apelido ainda, está estranhamente difícil dessa vez.


  Que tal... Sora? Parece um bom nome para um Eevee.


  Mas e quando ela evoluir?
  May cruzou os braços.  Uma mulher kantoniana e bissexual chamada Koharu me disse que as possibilidades são infinitas, embora ela seja contra a evolução das Eevee, mas fica difícil decidir um nome sem saber como ela vai ser!


  Olha, eu tenho um Swampert chamado Mudz e um Linoone chamado Zagz, eles aceitam super de boa embora eu tenha pensado algumas vezes em adaptar para Swamps e Lino, mas é aquela coisa, né? Já criaram uma identidade, só os vejo assim agora. Não se estressa com isso, não! Vai encontrar um bom apelido logo.


  Eeebui?  A Eevee olhou confusa para May, que sorriu em resposta, sem muita confiança.


  O que estão fazendo aqui do lado de fora?  Norman se aproximou com Birch, ambos carregando sacolas de compras.  Brendan, deveria estar com a sua mãe!

  Ela já está se divertindo...


    No sofá da sala de Brendan, Caroline e Duskull riam muito juntos. O fantasma pintava suas unhas enquanto ela chegava a lacrimejar de tanto gargalhar das gravações de Brendan que a Pokédex reproduzia.


  Mur, mur!  Aster, a Whismur, subiu na mesa e lançou-se na maçaneta da porta para abri-la.


  Olá, pequena!  Birch a cumprimentou.  Pode me ajudar com isso?

  Mur!  Demonstrando uma força incrível, Aster levantou todas as sacolas com uma só mão, saltando de volta à mesa para deixá-las lá.

  O que vocês tem dado para ela comer?  Brendan perguntou e seu pai riu, coçando a barba.  Okay...


  Eevee, sem bagunça!  May avisou para a pequena raposa que já cheirava um vaso de plantas do Salamence.


  Brendan, Duskull estava me contando sobre como você foi humilhado tendo que carregar as bolsas da Diantha!  Caroline disse, e Brendan forçou um riso pelo nariz.  Que bom que nada mudou, né? Continua o mesmo de sempre.


  Entãããão!  May se agarrou ao braço de Brendan antes que ele pudesse responder sua mãe.  Pai, você que vai preparar o almoço?

  Senti um pouco de medo nessa sua pergunta! Sua mãe adorava a minha comida, viu?

  Aposto que só estava sendo simpática...


 — Deixem comigo  Brendan se ofereceu.  Podem descansar.

    Pegando o celular, Brendan foi para a cozinha, que se abria para a sala, já sorrindo para a tela. May cruzou os braços, enquanto seu pai e Norman se juntaram no outro sofá para conversar.



    Na casa de Barry, Skorupi dava play com o ferrão da cauda num rádio, e uma música ambiente agradável começou. Chimchar o puxou para uma dança, e Marley riu para os dois, tomando cuidado para não tropeçar já que segurava pratos e talheres nos braços.

  Barry, me ajuda a estender a toalha na mesa?


  Aham... — Barry respondeu sem tirar os olhos do celular, e não saiu do lugar, recostado na mesa.


  Barry?  Ela chegou mais perto, espiando suas mensagens e vendo que era uma conversa com Brendan. Ele estava rindo de uma foto de Salamence com uma flor no nariz.  Barry, eu preciso de ajuda aqui!


  Desculpa, estou aqui, pode falar!  Ele guardou o celular, sorrindo envergonhado, e viu sua irmã respirar cansada.

    Ele pareceu entender o que deveria fazer, e logo foi estender a toalha. Sem muita expressão no rosto, Marley distribuiu pratos com bordas douradas pela mesa, talheres brilhantes de metal e guardanapos de pano dobrados perfeitamente.


  Só três pratos?
  Barry reparou.  Está faltando um.


  Você sabe que ele não vem.

  Deixa disso, ele prometeu que viria! E ele nunca faltou o jantar do dia dos mães, é sempre a parte mais divertida.

    Marley o encarou por alguns segundos antes de se virar para pegar mais um dos pratos bonitinhos. Logo viu Barry de volta ao celular, rindo de novo.


  Oh!  Lindalva chegava à cozinha, ainda de pijamas, vendo Marley arrumando o café da manhã na mesa.  Eu sempre me surpreendo, mesmo vocês me acordando assim todo ano! Pena que é só um dia, né?

  É uma tradição  Marley disse, e esboçou um sorriso curto quando sua mãe se sentou à mesa. Até parecia que estavam todos bem, e isso foi o suficiente para ela se convencer naquele momento e sentar também.

  Waffles com geleia de razz berry, que delícia! Meus preferidos!

  Você merece, mãe  Barry disse enquanto mastigava também um dos waffles. 

  Esses estão especialmente gostosos... Onde compraram?


  O Brendan indicou os do Fan Club aqui da cidade, lá só tem coisas gostosas. A Marley passou para pegar os mais fresquinhos!


  Esse garoto tem mesmo bom gosto.  Ela deu outra mordida.  Vocês são uns amores!

    Marley desviou o olhar quando percebeu sua mãe se voltar para ela, desfazendo seu curto sorriso.

  Obrigada por isso, filha.


  De... nada.  Ela respondeu, com as bochechas rosando.  Vamos escolher um filme para assistirmos juntos antes de almoçar.

  Claro, vou só me arrumar antes para estar bonita para quando seu pai chegar.

  Será que ele topa uma batalha comigo hoje?
  Barry perguntou e Chimchar se animou com a ideia.


    Vendo sua mãe se levantar rindo, Marley encarou seu prato vazio, tão brilhante que via o reflexo de sua expressão mórbida nele.



  AIIIIIIIIII, MAMÃE, SUA LINDAAAA!!

    Em sua casa em Sootopolis, Lisia chegava já saltitante e sorridente, abraçando sua mãe e quase a derrubando para trás.


  Que saudades eu estava, e que roupa bonita está usando, quem te deu? Foi algum namorado?


  Que nada, mãe, eu comprei lá em Sinnoh! Também te trouxe esse presentinho aqui, é um verniz para portas, armários e mesas!


  Ô minha filha, que linda! Não precisava de tanto carinho, vem aqui me dar um beijo!


  PARFUM!  exclamou seu pai, Ichiya, rodopiando com uma taça de vinho.  Meus bebês estão em casa, que dia feliz!


  Já somos bem grandinhos para sermos chamados assim, pai  disse Wallace, chegando com um arranjo de flores.  Para você, minha mãe.


  Muito obrigada, meu Anfitrião lindo! Coloca aqui dentro das minhas portas para eu sentir o cheiro!


  Um filho Anfitrião, que orgulho!  Ichiya espalhou perfume ao redor de Wallace, que riu com uma mão na cintura.  Wallace só nos dá orgulho!

  Não é lindo, Lisia?  Sua mãe perguntou.   Um título com tanto prestígio!


  É sim  Lisia sorriu sem graça, e ouviu o som da televisão aumentando na sala.  Harley está em casa??


  Onde?  Era Enzo Amore, que se levantou assim que ela apareceu na sala, olhando para todos os lados.


  Hein?! É você?! Cê não tem mãe, não?


  Minha mãe é a vingança! Estou a espera do Harley para ele ver quem é o grande Enzo Amore!


  Ah, claro... Ô Wallace, por que é que você trouxe esse maluco aqui pra dentro?


  Ele insistiu em vir, e como é meu campeão, é bom passarmos algum tempo juntos.


  Oh, Harley, você veio  Armarilda surgiu ao lado de Enzo.  Está menos bundudo, não está seguindo a rotina de rebolados?


  Eu não sou o Harley, senhora. Pelo contrário, sou o principal rival dele, e juro derrotá-lo em nome do amor.

  De novo sendo rebelde, esse é meu filho!


  Parfum!  Ichiya borrifou perfume nele, que começou a tossir.  Pidgeot, vem aqui comer alpiste!


  Pru, pru pru, pruu  Pidgeot usava um colar no pescoço e uma peruca parecida com os cabelos de Harley, e passou andando pelo carpete da sala, entre Wallace, Lisia e Enzo Amore.


  Nossa, que loucura é essa?  Enzo perguntou se benzendo.  Que aberração! A natureza não seria capaz de criar algo assim, seria?


  Eu avisei como era Sootopolis, mas você quis vir  Wallace deu de ombros.


  Mas será que ele não vai aparecer?  Lisia perguntou, olhando para seu pai penteando Pidgeot. Wallace respirou fundo antes de responder.


  Isso não é problema nosso. Ele sabe bem o que faz, e se ele vai sustentar esse drama até o ponto de não vir numa data como essa, então não tem nada que possamos fazer.


  Mas... Eu acho que nós nem tentamos fazer nada  Lisia disse, e Wallace levantou uma sobrancelha.


  Eu tentei, sim. Você não?  Ele a perguntou, e os dois ficaram em silêncio.


  Podem dar licença? Quero assistir o especial de dia das mães do Starly Encantado  Enzo reclamou.

  Wallace, vem aplicar verniz na mamãe!  Armarilda chamou de outro cômodo.

  Estou indo!



Boa tarde, mundo e Alola! Nós da Patrícia Notícia desejamos um feliz dia das mães para todas as mães, pais que também são mães, mães que também são mães e também para a Mudsdale Juju que fez uma doação generosa para nosso programa continuar existindo na TV Leon. Hoje começamos com a notícia de que a Jasmine, líder de ginásio de Johto que estava presa acusada de envolvimento com Contests, foi solta e está de tornozeleira eletrônica em Galar, participando do Star Tournament. Patrícia está nas ruas com uma testemunha que alega ter visto Jasmine pedindo para seu Steelix usar Speed Star, o que sabemos que é ilegal em todo o território de Kanto e Johto.


Boa tarde, aqui é a Patrícia com a Notícia que você precisa! Pode falar, querido.


Eu estava treinando meus Pokemon poderosíssimos para derrotar o Flint porque tínhamos uma batalha marcada, quando senti tudo tremendo assim, bum! Aí eu pensei comigo, aí só pode ser coisa do Brendan, aquele Coordenador mal amado, então eu fui investigar e me surpreendi porque era a Jasmine! Ela falou bem assim "Steelix, use 
Speed Star"!


E ele usou?


Não porque ele não sabia esse ataque.



Nossa! Então é isso, Jasmine pode estar solta mas o julgamento ainda não acabou, então nosso dever como cidadãos do bem e patriotas é ficarmos atentos ao nosso redor! Lembre-se, se vir um Pokemon usando 
Speed Star ou fazendo qualquer combinação, denuncie!


  Que exagero!  Norman resmungou, colocando a televisão no mudo quando começou a ser transmitida uma partida de vôlei com um Combusken sacando.  E pensar que o tempo passa, mas Johto continua desse jeito. Fico feliz pelas crianças terem crescido aqui em Hoenn.

  Como é desconstruído, meu marido!
  Caroline o deu um beijo na bochecha, e ele sorriu orgulhoso.


  A Jasmine não tem um dia de paz, essa mulher está sendo perseguida dia e noite, qualquer movimento dela já chamam a polícia
  May disse, acariciando Eevee.


  Dizem que ela está movimentando muitas pessoas em Johto e regiões próximas, que não concordam com essa política anti-contests
  Birch apontou.


  Aí é que está, era mais vantajoso ela ficar quieta, mas tá sendo burra e dando a cara a tapa, daqui a pouco o Lance manda é matarem
  Norman riu do que disse, e olhou para Brendan percebendo ele revirar os olhos enquanto fatiava legumes.  Que reação foi essa, Brendan?


 — Uh?
  Brendan olhou assustado.  Não, nada.


  Não criei filho pra ele revirar os olhos pra mim. O que te incomodou? Fala logo e para de...
  Brendan o encarou mais sério, e Norman repensou o que dizia.  Para de besteira.

    A faca de Brendan parou no meio da tábua. Ele respirou fundo antes de falar.


  Eu só não acho que a Jasmine deva ser julgada dessa forma. Se essa história for real, ela não está sendo burra, ela está tentando mudar a realidade horrível que vivem lá em Johto.

    Caroline e May trocaram olhares rápidos, tensas, mas não disseram nada. Norman se ergueu do sofá e foi até a cozinha, sua sombra encobriu o filho.


 — Eu cresci naquela região, eu sei como Coordenadores são vistos. Você tem experiência do quanto é difícil mudar o ponto de vista de alguém que só conhece uma forma de pensar como a certa, mas eu sou seu pai, aquela mulher é uma líder de ginásio, ela tem um compromisso político com a região dela. Ela sabe muito bem que não se deve ensinar Speed Star para um Steelix por lá!


  Nossa, que absurdo! Desde quando um movimento define quem alguém pode ser?


  Eu não estou gostando do seu tom de voz, Brendan. Está estragando o dia da sua mãe e nos constrangendo na frente do meu amigo e da filha dele!


  Me desculpe, Norman, eu que puxei o assunto  Birch disse, mas Norman nem deu corda.


  Eu só não concordei com o que você disse, isso te atingiu tanto assim?
  Norman avançou mais um passo. Brendan sentiu o peito se inflar.  Você experimentou competir nos Contests para me entender melhor e eu admiro isso, mas não é um Coordenador. Não compreende o que é tudo isso, a perseguição e as caras viradas, você não faz a mínima ideia! Eu também não fazia, porque aqui em Hoenn você era a única pessoa que me repreendia por ser quem eu sou, mas em Sinnoh é diferente. Você me intimou a estudar numa escola de líderes de ginásio que me odeiam porque sou Coordenador. Eu me esforcei para me enxergarem como mais do que isso e nem deu tão certo!


    Norman abriu a boca e levantou a mão, mas não sabia o que fazer, apenas cerrando os dentes. A voz de Brendan falhou por um segundo, mas voltou mais forte, não recuando.



 — 
Então sim, eu admiro a Jasmine! Porque ela está fazendo o que ninguém mais tem coragem, mesmo que custe tudo!


  Brendan...?


    O garoto, eufórico, percebeu que todos olhavam para cima, assustados. Uma nuvem tempestuosa flutuava acima de sua cabeça, e isso o irritou ainda mais. Ele retirou as luvas de cozinha que usava e saiu andando depressa, esbarrando na cadeira e subindo as escadas até o quarto, enquanto a nuvem o acompanhava por um segundo antes de se dissipar.


    Ao mesmo tempo, um homem musculoso, loiro e de olhos verdes abria a porta de sua casa.


  Querida, cheguei!  Ele disse, retirando o blazer.


  Meu amor!
  exclamou Diantha, forçando um sotaque.  Estava te esperando! Filho, pode fechar a porta para o seu pai? Ele está cansado depois de um longo dia de trabalho.


  Mas qual porta?
  perguntou o filho.

  Como assim, filho?


  Qual porta?! Detesto me repetir!
  o garoto se irritou.  Ninguém me entende aqui em Coumarine, eu deveria me entupir de malasadas e me matar!

    Marley sorriu de lado para a televisão, mas era um sorriso fraco, mais de hábito do que de diversão. Todos os anos assistiam aquele filme, uma comédia que resolvia a eterna disputa sobre qual escolher. Agora, sentada no sofá com a almofada no colo e o controle apoiado por cima, ela se sentia um passo fora da cena que estava acontecendo.
    Barry estava deitado de costas no carpete, o celular iluminando o rosto, rindo a cada cinco segundos de algo que Marley não conseguia alcançar. Do outro lado, sua mãe permanecia sentada com as pernas cruzadas, deslizando o dedo na tela como se estivesse em outro lugar, em outro tempo.

 — Uh? — Barry notou quando o som da televisão sumiu.

 — O que houve? — Lindalva baixou o celular, olhando para Marley se levantar.


  Já que estão ocupados para assistir o filme, podemos fazer isso depois. Ou nunca. Que seja.

  Não, filha!
 Eu só me distraí rapidinho...

  Em que parte estávamos?
  Marley a encarou.

  Quando a Diantha esquece o forno ligado?


  Isso foi há 20 minutos!
  Marley levantou os braços, exasperada.

 — Desculpa
  Barry pediu, se levantando, e Chimchar logo se agarrou ao seu braço.  Podemos voltar a ver o filme...

 — Ou assistir outra coisa. Tem um dorama novo que estou querendo ver — disse Lindalva, deslizando os dedos no celular de forma automática.

    Marley respirou fundo, sentindo o ar pesar ao redor.


 — Quando o seu pai chegar, ele... — a frase morreu na garganta.


  Se ele estivesse aqui, estariam prestando atenção?
  Ela franziu a testa, e o silêncio respondeu por eles.  É impressionante. É só ele aparecer que todo mundo ganha vida, não é? Quando ele não está, este apartamento parece um lugar suspenso, ninguém fala direito, ninguém se move de verdade, ninguém presta atenção em nada. Tudo aqui parece que só existe por causa dele... Até eu mesma. E hoje era para ser o seu dia, mãe! Nem isso você pode ter?!

    Marley deixou a almofada no sofá e foi para o seu quarto, trancando a porta. Barry e sua mãe continuaram no mesmo lugar, e se olharam como se pedissem uma resposta do que fazer agora.

  Eu vou ligar para ele e perguntar se já está chegando  Lindalva disse por fim, se levantando e levando o celular ao ouvido, indo em direção à cozinha.


  Chaaar?  Chimchar escalou até o pescoço de Barry, o dando um beijo na bochecha. O loiro sorriu, mas seu celular vibrou de novo.

Acabei de brigar com o meu pai na frente de todo mundo por causa da JASMINE!


  Chimchar, o que há de errado comigo?  Barry perguntou, baixando o aparelho. — Eu continuo esperando ele, querendo ser como ele... Mas minha família está distante, Marley está magoada e eu... Eu não sei se quero mais isso.

  Chiiimmy!
  Chimchar saltou de seu colo para o sofá, levantando o controle remoto da TV.

    Barry ligou a televisão novamente, e no filme, o casal almoçava junto à mesa, com o filho reclamando que a mãe estava comendo mais que ele. Ele suspirou. Aquela não era a família dele.

Brendan... Me ajuda com uma coisa?


    Em seu quarto, Brendan estava deitado na cama. Finalmente largou o celular, mas agora encarava o teto. Ouviu baterem na porta, mas não respondeu, até ouvir a voz de sua mãe do outro lado perguntando se podia entrar.


  Foi só você chegar, que tudo aqui já virou uma bagunça  ela disse, com as mãos na cintura, e ele já se arrependeu de ter aberto a porta.  Você tem esse dom de criar confusão.

  Eu não queria nada disso, mas ele decidiu brigar comigo...

  Hm.
  Ela se abaixou para pegar uma blusa do chão.  Céus, garoto! Existem gavetas por um motivo! O que estava procurando aqui?


  Alguns cadernos antigos de desenho. Tinha rabiscado um uniforme para Pulu e Mini usarem num evento da Leuri uma vez, mas acabou não indo pra frente.


  É? Sabe que não entendo nada sobre isso e nem me importo, né?  Ela riu dele, e abriu uma das portas do armário, afastando algumas coisas da prateleira superior.  Aqui, eu organizei seus cadernos no alto para Aster não pegar e comer, ela fez isso com o papel higiênico e seu pai tentou dar um chute nela, mas acabou que ela aprendeu Mega Kick e deu uma surra nele.

  Ah, obrigado!
  Ele pegou o que estava procurando, sorrindo, mas logo voltou a ficar cabisbaixo.


  Ué?  Caroline percebeu algo.  Você não está usando os seus óculos.


  Eu consertei depois que quebraram há alguns anos, mas tenho preferido as lentes...


  Pois eu gosto de você com eles.
  Ela avistou o estojo dos óculos ao lado de uma moldura de Brendan, Harley e May, numa mesa próxima da cama, e foi pegá-lo para entregar a ele.  Me conta, lá naquela escola está tão ruim assim? Seu pai disse que o ensino médio foi a melhor experiência da vida dele.


  Tem partes boas...
  Brendan sorriu ao pensar em Barry.  Mas não é muito agradável estar num lugar onde o tempo inteiro ficam te atacando por competir em Contests.


  Que besteira! Eu vivo rindo de você e isso nunca foi um problema.
  Brendan sorriu sem graça.  Você sabe, para mim nunca foi fácil conviver com você... Mas eu aprendi. Até fui me consultar num psiquiatra outro dia porque senti sua falta, achei que estivesse ficado maluca ou pior!

    Brendan riu da história, e Caroline também se deixou levar. Ela encostou em seus ombros, olhando bem nos olhos dele.


  Eu agora vejo que você está sim diferente do habitual. Não sei se percebeu, mas usou a sua voz para comunicar ao seu pai o que acha certo, confrontou ele. 


  Eu só... Estou cansado dessa situação toda. Ouvir sempre coisas assim e nada mudar... Não quero fazer parte disso.


  Filho, se sente que não existe lugar pra você nesse mundo, é hora de você criar o seu.


    Brendan abriu a boca, surpreso por ela ter dito algo legal assim. Sua reação foi abraçá-la, e ela revirou os olhos, dando um tapinha nas costas dele.


  Tá, chega, não abusa da minha boa vontade não
  ela disse, abrindo espaço para separar o abraço.


    Na sala, Norman encarava uma foto sua com um traje de Contests, no palco junto de seu Slaking, competindo contra Juan e sua Skitty. May e Birch haviam assumido a cozinha, e o cheiro estava bom. Eevee saltou para o sofá, olhando torto para ele, que sorriu sem graça.


  Vai demorar muito aí?  Caroline disse, entrando na sala.  Tô faminta!


    Norman se levantou ao ver que Brendan vinha atrás dela. Estava usando seus óculos, e disfarçou uma olhada que deu em sua direção.

  Vocês dois não tem o que resolver, não?  Ela bateu duas palmas, empurrando Brendan na direção do pai.

    Os dois não conseguiram olhar nos olhos de imediato, até Norman se levantar.


  Desculpe pelo que eu disse  Norman pediu, se curvando, o que pegou o garoto de surpresa.  Você não estragou dia nenhum... Eu que estou estragando.


  Pai...


 
— Às vezes fico tão preso nas minhas próprias ideias do que é normal que esqueço que ouvir realmente importa. — Norman respirou fundo.
 
 Obrigado por me lembrar disso, filho.

 — É isso aí! — Caroline bateu palmas uma vez, sorrindo de canto. — Agora o drama pode acabar nessa casa!

    May riu, cruzando os braços, e Birch se apoiou na porta da cozinha, sacudindo a cabeça com um sorriso.


 — Acho que finalmente teremos um pouco de paz por aqui — disse May. — Pelo menos até o próximo feriado!


 — Paz relativa — Birch acrescentou, rindo baixo. — Mas é bom ver que eles estão se entendendo melhor.


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    Em seu quarto, Marley estava sentada sobre as pernas, no chão. Seu baú estava aberto à frente, e entre os diversos itens e recordações de sua jornada, ela segurava a pelúcia de Gothita mais gasta entre as diversas do quarto. Teria continuado mais um tempo daquele jeito, quando sentiu um cheiro de queimado e arregalou os olhos, correndo logo para fora do quarto e dando de cara com sua mãe no corredor.


  Barry  disseram elas ao mesmo tempo.

    As duas correram para a cozinha, encontrando muita fumaça, e Marley foi logo desligar o fogo, tossindo. Lindalva viu Chimchar agitando um pano como se tentasse espantar o desastre, mas ele se envergonhou por ter sido descoberto.

  BARRY! — a mãe gritou, abrindo a janela. — O que você fez?!


 — Calma, está tudo sob controle! Era pra ser panqueca de razz berry! — Barry apareceu com uma espátula na mão, o avental amarrado torto e o celular equilibrado entre o ombro e a orelha. — Brendan jurou que dava certo se eu seguisse a receita direitinho!

 — Você fritou com o papel ainda embaixo? — Marley ergueu o olhar, incrédula.

 — Eu achei que ajudava a não grudar!

    Chimchar pulou no balcão, mostrando a tela do celular ainda acesa com mensagens;

 Mistura primeiro a farinha com o ovo, e depois o leite.
Não, Barry! Não põe tudo de uma vez!
Deixa comigo, molezinha!
Isso vai virar cimento!

 — Eu tentei seguir! — Barry se defendeu, tentando virar uma panqueca que grudou inteira na frigideira. — O fogão do Brendan deve ser diferente, não é possível que fiz algo errado.

    Marley bufou, mas escutou sua mãe rindo. Ela e o irmão olharam para ela, percebendo que até lacrimejava. Tinha farinha para todos os lados, a pia cheia de talheres e Chimchar lambendo por dentro de um pote de geleia que certamente ele colocaria de volta na geladeira e nunca seria sido descoberto.


  O que estava tentando fazer, meu filho?  Ela perguntou, retirando a luva da mão dele, que estava colocada ao contrário.


 — Surpresa! — Barry ergueu o prato meio queimado. — Eu ia fazer algo diferente para jantarmos... mas a receita não colaborou.


  Você é um pesadelo na cozinha, e eu costumo gostar de pesadelos, mas esse é demais até pra mim
  Marley provocou, rindo dele tentando se justificar.  Se o pai visse isso...


 — Mas ele não vai
  Barry ficou sério, e Marley percebeu seu olhar entristecido.  Você tinha razão, ele não vem hoje. Me desculpe por ter insistido.


  N-Não!
  Marley sentiu seu coração amolecer ao escutar essas palavras do irmão.  Barry, eu... Eu sinto muito. Queria que fosse diferente.


  Está tudo bem... É melhor focarmos em quem está aqui, né?
  Ele forçou um sorriso, e Marley fez o mesmo.


  Crianças, vocês não deveriam ser tão maduros...
  Lindalva disse, puxando uma cadeira toda suja de farinha, que quando ela sentou fez uma nuvem pelo ar.  Desde que ele perdeu o cargo como Campeão, estamos tão distantes... E não que antes ele fosse super presente. Eu demorei muito a perceber isso, mas quero tanto acreditar que estou errada e que estamos todo bem! Se eu me esforçar como esposa, talvez ele...

    Lindalva parou de falar, virando o rosto para o lado e levando a mão até a boca. Barry e Marley se aproximaram dela, e ela sorriu.


  Me desculpem, eu tambem não desejava que fosse assim. Preciso encarar a realidade...


  Eu também me desculpo por forçar
  Marley disse por fim, com as bochechas vermelhas.  Me revolta ver vocês dois alimentando expectativas sobre ele e o usando de referência em tudo o que fazem. Vocês são tão mais do que isso... São importantes. Queria manter a nossa tradição dessa data, mas não tem como, de novo, por ele não estar aqui.


  Então... vamos mudar o cardápio
  Barry sugeriu, estalando os dedos. — O Brendan também tentou me ensinar a fazer massa, se o Chimchar usar o Flamethrower um pouco mais fraco agora, quem sabe...

  VOCÊ ACENDEU O FOGÃO COM O FOGO DO CHIMCHAR?!  Lindalva quase desmaiou.

  Ok, vamos pedir pizza, todos de acordo?
  Marley já pegou seu celular, rindo.

  Apoiamos essa decisão
  Barry disse, e sua mãe também assentiu, dando um beijo na testa dele.

  Chaaar!
  Chimchar prendeu o pote de geleia na boca, mas observou sua família sorrindo junta como há muito tempo não via.


    A noite chegou sobre Littleroot, e dentro da casa de Brendan, o jantar seguia mais alegre, com todos conversando. Desta vez, a televisão permanecia desligada, e escutavam só o som dos talheres entre as falas de cada um.


    May se levantou para levar o prato até a pia e, antes de sair, se deteve junto à janela. Do lado de fora, o céu limpo se riscava por um instante com uma estrela cadente que cortou o horizonte e sumiu no escuro. Ela a acompanhou com os olhos, sem pensar em pedir nada, apenas vendo. Birch se aproximou em silêncio e, sem dizer palavra, passou o braço pelos ombros da filha, puxando-a de leve para perto.


    Em Sootopolis, o ranger das portas de Armarilda ecoava pela sala de sua casa, enquanto ela e Ichiya folheavam álbuns antigos diante de Enzo Amore, que escutava tudo com genuíno desinteresse. As fotos antigas traziam o mar do passado, crianças de fraldas, primeiros campeonatos de natação, sorrisos borrados de sol. Wallace, recostado no sofá, disfarçava o constrangimento.


    Lisia se afastou devagar, com uma fotografia em mãos: Harley bebê, ela o segurando, Wallace com sua cara de sabichão de sempre ao lado, os três ainda sem o peso das escolhas que viriam. Ficou olhando por um tempo, até as vozes de seus pais se tornarem um ruído distante. O suspiro que escapou de seus lábios foi leve, e a brisa que entrava pela varanda o levou junto, perdendo-se rumo ao mar.


    Em Jubilife, no apartamento de Barry, a mesa improvisada de caixas sustentava pizzas abertas, e o chão estava um caos cheio de guardanapos amassados, copos e cartas de DITTUNO, jogo que os três estavam jogando juntos. Buizel e Umbreon disputavam as fatias esquecidas, Skorupi e Graveler trabalhavam numa forma de libertar Chimchar do pote de geleia, e Starly dormia empoleirada na televisão.


    A porta se abriu devagar, e Palmer parou no batente. Observou os três por um tempo, sem ser notado, e seu sorriso não era triste. Ficou alguns segundos assim, entre o frio de fora e o calor que vinha da sala, antes de fechar a porta outra vez, em silêncio.


    No jardim da mansão abandonada da Floresta de Eterna, Magearna regava as flores quando suas orelhas se alertaram, e ela se virou para o portão.

 — Você sempre aparece nesse mesmo dia, cedo ou tarde — ela disse, juntando as mãos.



    Cyrus parou, tinha o casaco amassado de viagem e a expressão distante. Por um instante pareceu procurar algo a dizer, mas apenas respirou fundo.

 — Magearna... — começou, hesitante. — Ela já esteve aqui hoje? Não queria vir ao mesmo tempo.


 — Não estive na presença da senhorita Berlitz hoje.

    Cyrus assentiu, sem mais perguntas, e atravessou o jardim até a grama alta. Sentou-se devagar, como quem não quer quebrar o silêncio. Magearna o observou por alguns segundos antes de se mover, o corpo de metal fazendo um som de engrenagens durante todo o caminho, até se abaixar para imitá-lo. Quando ele inclinou a cabeça e a deixou repousar sobre o ombro dela, ela não se moveu.

Continua

Um comentário:

  1. Foi um capítulo bem lindinho e dramático. Líderes de ginásio presas e perseguidas em Johto geram discussão numa família em Hoenn. Enzo Amore visita a família de Harley e não se questiona sobre a mãe ser um armário e em Sinnoh uma família vê um filme da Diantha enquanto um dos elementos dessa família aguarda a chegada do patriarca.
    Me lembra a minha vida. Em que é que lembra a minha vida, vejo você perguntar? Bom, em nada mesmo, mas eu quis dizer que lembra para poder falar referências. Eu amo referências e concordo que Sora é um excelente nome para um Eevee que não evolui.
    Eu gostei do capítulo, aconteceram coisas fofas, discussões dramáticas e muita gente pensando em coisas que gostariam que tivesse acontecido mas não aconteceram.
    Also Speed Star… Speedster… eu realmente me impressiono como demoro tempo a perceber as coisas, deve ser por isso que tenho a porta aberta… mas who knows?
    Feliz Hallow... digo, dia das mães... bom, a culpa é sua por postar cap de dia das mães no Halloween. Do better!

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Capítulo 54: Dia das mães.

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